domingo, 18 de julho de 2010

NERO O GRANDE PSICOPATA

Ele mandou matar a própria mãe, duas esposas e até São Pedro. Mesmo assim, em seu curto reinado, ele tentou bancar o artista sensível
O ano é 64. Estamos em Nápoles, no sul da Itália, perto de onde, apenas 15 anos depois, o Vesúvio destruiria várias cidades, incluindo Pompéia. Um artista está fazendo sua estréia para o grande público. Loiro, de olhos azuis e um tanto gordo, ele atua descalço, usando apenas uma túnica. Toca lira e canta músicas que ele mesmo compôs. A apresentação é horrível, e mesmo assim ninguém se levanta, porque abandonar o show seria um crime punido com a morte. Na platéia, uma mulher entra em trabalho de parto e tem o filho ali mesmo. Algumas pessoas simulam desmaios, para serem arrastadas para fora do teatro e escapar. O artista em cena é ninguém menos que o imperador romano Nero Claudius Caesar Augustus Germanicus. “Paranóico, megalomaníaco, assassino e sem caráter: esse era o perfil do ditador que manteve o império curvado às suas vontades durante os 14 anos de seu reinado. O curioso é que, a princípio, ele não tinha chances de sentar-se no trono”, diz Graeme Barker, arqueólogo e professor da Universidade de Cambridge, na Inglaterra.

Nero só chegou ao trono por causa de sua mãe, que fez e aconteceu para ver o único filho controlando o império. Fez e aconteceu mesmo. A história da ascensão do filhinho da Agripina envolve orgias, incesto, assassinatos, intrigas e traições. Nero nasceu com o nome Lucius Domitius Ahenobarbus, filho de Agripina com Gnaeus. Sua mãe era irmã e amante do rei da época, Calígula, e usou seu poder para conspirar contra ele. Calígula, que era maluco mas não era bobo, descobriu tudo e despachou a mulher para a ilha da Sicília. Enquanto ela estava afastada, seu marido morreu por causa de um edema e o grande imperador foi assassinado.

Naquela época, Lucius tinha 2 anos de idade. Quem assumiu o poder foi Tiberius Claudius, também sobrinho de Calígula. Nessa dança de cadeiras, Agripina voltou a Roma e se casou com o milionário Gaius Sallustious Passienus Crispus. Aí ela envenenou o sujeito, ficou com o dinheiro e começou a namorar o próprio imperador Claudius. Tanto fez que conseguiu fazer com que a rainha Messalina fosse condenada à morte por suspeita de traição. Com o caminho livre, Agripina casou com o imperador e se tornou rainha.

Imperador adotivo

Lucius, que estava com 13 anos, passou a ser o primeiro candidato a imperador e mudou de nome. O filho legítimo do rei, Britannicus, era mais jovem do que Nero, o novo filho adotivo. “A adoção era comum entre os senadores. Eles precisavam de herdeiros homens, e também aproveitavam para usar os novos filhos para aproximar famílias importantes e poderosas”, explica Ronaldo Vainfas, professor de História da Universidade Federal Fluminense.

Mais do que filho adotivo, Nero se tornou um xodó do imperador. Ele adiantou a maioridade do rapaz para 14 anos e o casou com sua filha Octavia. Depois de tantas confusões dignas das novelas das 8, os planos de Agripina alcançaram o objetivo: no dia 13 de outubro do ano 54, Claudius morreu e Nero, com apenas 17 anos, se tornou o quinto César. “Agripina assassinou o marido para acelerar a subida do filho ao poder. Ela queria usar Nero para governar”, diz o historiador.

E, realmente, nos primeiros cinco anos de reinado, Nero não deu palpite nos assuntos administrativos. Preferia ocupar o tempo entre corridas de bigas e orgias para lá de animadas. “Foi um período marcado pela paz e pela boa administração”, conta Dan Roberts, historiador e professor da Universidade de Richmond, nos Estados Unidos. “Os problemas começaram quando Nero se apaixonou pela escrava Claudia Acte e sua mãe não concordou”, acrescenta. Foi então que o garoto mostrou a que veio. Contra todas as expectativas, rompeu com a mãe, incorporou o título de Augusto e resolveu mandar no governo. Agripina tentou reagir, e começou a conspirar para colocar Britannicus no poder. Mas, é aquela história: filho de peixe peixinho é. Nero envenenou o irmão durante um jantar.

Depois, o imperador virou Roma de cabeça para baixo. Nessa mesma época, assumiu publicamente que tinha dois amantes, Marcus Salvius e Poppaea. Dizia que era, ao mesmo tempo, esposa dele e marido dela. Em 59, Nero deixou os súditos de cabelos em pé ao planejar a morte da própria mãe. E olha que não foi fácil: Agripina só morreu depois de cinco tentativas. Na última, foi esfaqueada e não resistiu.

Fogo!

Em julho de 64, Roma pegou fogo. Todo mundo tinha certeza de que Nero era o culpado, apesar de até hoje ninguém ter conseguido provar o envolvimento direto do imperador. “Incêndios eram comuns em Roma. A cidade tinha muitos condomínios de três ou quatro andares, feitos de madeira e divididos por várias famílias. Mas nunca tinha acontecido um incêndio tão destruidor como o daquele verão”, diz Gregory Warden, arqueólogo e professor da Southern Methodist University, nos Estados Unidos. “A famosa imagem de Nero tocando lira e cantando no teto de um de seus palácios, enquanto Roma virava fumaça, foi muito divulgada por seus inimigos”, completa. O fato é que Nero aproveitou o incêndio para construir palácios e aumentar o ataque aos cristãos. Sua imagem pública nunca mais se recuperou.

Suspeito de incendiar a cidade, Nero botou a culpa nos cristãos. Depois, se dedicou a destruir essa nova seita. Um de seus castigos favoritos era jogar os fiéis aos leões na arena, onde eles eram destroçados. O povão adorava. Outro costume do imperador era queimar cristãos vivos para iluminar os jardins de seu palácio. Entre os religiosos que ele mandou matar estão dois dos homens mais importantes da história do cristianismo: São Pedro e São Paulo.

No ano 67, depois de voltar de uma turnê artística pela Grécia, o imperador encontrou uma oposição política bem organizada. No ano seguinte, foi deposto pelo Senado e condenado à morte. Em vez de se entregar, pediu que um de seus funcionários rasgasse sua garganta com uma adaga. Segundos antes de morrer, Nero declarou: “O mundo acaba de perder um grande artista”.

(Texto: Natalia Yudenitsch)

2 comentários:

  1. A história de Nero é fascinante, mas muito cheia de contradições.

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  2. Fascínio que fascínio era um psicopata sanguinário

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